sexta-feira, outubro 06, 2006

Jean-François Revel (7)

A TRAIÇÃO DOS PROFESSORES


Imagem de Robert Doisneau

Não se pode separar o desenvolvimento do conhecimento. A filosofia terceiro-mundista tenta evitar esta dependência do conhecimento apelando à identidade cultural, que pouco tem a ver com defesa da cultura mas sim com a manutenção do «direito à ineficácia na produção e ao direito à corrupção na direcção. Porque o terceiro-mundismo é uma filosofia não do desenvolvimento mas da transferência de recursos destinada a perpetuar o subdesenvolvimento ao mesmo tempo que atenua a pobreza e, sobretudo, alivia as dificuldades de tesouraria dos dirigentes da pobreza.» No Ocidente o conhecimento é aceite na medida que se compreende a sua necessidade para propiciar o desenvolvimento, mas ao mesmo tempo ele é rejeitado sempre que parece estravazar esta missão.

Ao professor cabe a tarefa de transmitir a cada geração uma introdução condensada do conhecimento e dos valores actuais. Apesar de se reclamar como uma transmissão imparcial acaba por ser uma frequente arma de combate. Esta parcialidade não é de agora e por isso foi introduzido o conceito de laicidade para combater o desvio ideológico que havia no século XIX no ensino. Na altura era o cristianismo que invadia os domínios do ensino, agora é o marxismo, pelo que o laicismo não trouxe imparcialidade mas apenas um enviusamento diferente. Esta tendência apareceu depois do final da segunda guerra mundial, intensificando nos anos 60 com as revoltas da contracultura, que vieram ainda introduzir a ideia de que a própria transmissão do conhecimento era reaccionária.

Não se pense que no Ocidente a influência marxista no ensino foi apenas sub-reptícia, pela sugestão velada. Em 1980 o manual escolar para professores de Vicente, em França, dava as seguintes instruções:

«Mostrar-se-á que existem no mundo dois campos:

- Um imperialista e antidemocrático (USA);

- Outro anti-imperialista e democrático (URSS),

precisando os seus objectivos:

  • Dominação mundial pelo esmagamento do campo anti-imperialista (USA);
  • Luta contra o imperialismo e o fascismo, reforço da democracia (URSS).»
As filosofias modernas de ensino baseiam-se em dois postulados sem qualquer validade: Que as crianças têm todas as mesmas capacidades dadas pela genética; As diferenças de resultados dependem apenas das diferenças económicas e do meio social. É a confusão entre igualdade perante a escola e igualdade na escola. Sociólogos como Bourdieu defendem visões como esta e como corolário condenam o ensino tradicional como elitista e reaccionário porque permite que alguns alunos desenvolvam os seus talentos bastante acima da média. Para Jean-François Revel a televisão também contribui para a degradação da aprendizagem porque apresenta a informação fechada, quase impossível de rectificar, remove-lhe quase sempre o contexto e uma ordenação que lhe permitiria retirar conclusões. A aprendizagem é quase o inverso, «um processo permanente de rectificação, por integração constante de novos dados à representação inicial, que não deixa assim de se modificar.»

Os professores que se dignam a responder a estas críticas, respondem habitualmente com dois sofismas. Primeiro que sempre a política esteve ligada ao ensino e depois que os professores também têm direito a exprimir a sua opinião e participar no combate de ideias. Ora não é por haver uma política de ensino que isso dá direito aos professores de fazer política no ensino. Também ninguém retira aos professores o seu direito de entrar no combate político, mas fazê-lo enquanto professores é algo muito diferente. Porque quem ensina deve submeter o compromisso à verdade e não o oposto. E ao agirem como activistas políticos os professores cometem abuso de posição dominante, perante um público que não tem outra opção que não ouvi-lo.

MC
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