Prós & Contras
Se o óptimo é inimigo do bom, o mau arrasa com os doise é muito mais apelativo. Já foi quase tudo dito sobre o último Prós & Contras a propósito desses malvados dos americanos do 11 de Setembro. Que Mário Soares esteve deplorável, demagogo, senil, que Pacheco Pereira esteve muito melhor (e quem conseguiria não estar?) mas não conseguiu sair com nenhuma frase forte que galvanizasse o público, que Helena Matos no pouco tempo que teve conseguiu introduzir alguns pontos de extrema relevância, que aquele senhor alegadamente especialista no Islão, na verdade é mais bolos. Contudo, nada disto é de espantar, tudo até bastante previsível. Saliento, no entanto, três passagens que me pareceram introduzir alguma novidade.
O senhor advogado muçulmano teve uma intervenção bastante curiosa. De início estava meio ambíguo, por um lado não queria cair no ridículo de dar a entender que acreditava nas teorias da conspiração, mas por outro parecia que se sentia forçado a levantar algumas suspeitas, como se isso lhe facilitasse a vida. Mas depois surpreende por assumir de forma decidida que não quer que o seu modo de vida ocidental seja posto em causa e que acha ele é perfeitamente compatível com a ser-se muçulmano. Nos dias que correm já começa a ser difícil encontrar pessoas que mostrem algum apreço por aquilo que o ocidente é, pelo que acho de assinalar que esta tomada de posição é corajosa e justa.
Outro ponto que me pareceu relevante foi quando Pacheco Pereira disse a Soares para não se preocupar que eles, PP, tivesse mais tempo para falar porque a maior parte das pessoas concorda com Soares. Todos sabemos isto mas há certas que em televisão não se dizem, especialmente em programas para o grande público. Não me parece que Pacheco Pereira se tenha descuidado ou atirado a toalha ao chão. Parece-me apenas um constatar de que os debates de pouco servem a não ser para estancar esta hemorragia de irracionalidade. E talvez já nem para isso, os tempos parecem cada vez mais ser de caminho auto-infligido para o abismo. O que vou dizer de seguida não pretende ter qualquer graça e é apenas aquela que acho ser a melhor forma de descrever a situação. A não ser que Mário Soares, nos debates e entrevistas, comece a babar-se ou a fazer coisas do género, a maior parte das pessoas e a quase totalidade dos intelectuais continuará a achar o homem muito lúcido e carregado de razão. Se Mário Soares começara a fazer coisas dessas, e espermos que não, os que o apoiavam antes incondicionalmente vão-lhe retirar a razão não pelo que tem andado a dizer mas pela figura que passou a fazer. Repito que não há qualquer intenção de fazer humor com isto da minha parte e é com tristeza até que escrevo isto sobre um antigo Presidente da República que teve um papel importante na nossa História.
O terceiro e último ponto que saliento foi uma intervenção de Mário Soares, quase no final do programa. Pareceu uma tirada típica de político, onde afirmava as suas fortes convicções sobre o assunto em debate. Ora, as convicções têm o seu lugar quando não há nada melhor para as substituir, como os factos, raciocínios elementares derivados destes e mesmo o simples bom senso (não confundir com senso comum). Ora isto nada tem a ver com a provecta idade de Mário Soares, porque é uma atitude que se vê em pessoas de todas as idade. A substituição dos factos pelas “fortes convicções” não é apenas uma atitude isolada, é mesmo um método utilizado sistematicamente que permitiu a pessoas inegavelmente inteligentes chegar às mais aberrantes conclusões.
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