terça-feira, setembro 19, 2006

Jean-François Revel (3)

A MENTIRA E O GRANDE TABU


Tabu, Mark Nugent.

A mentira, a má-fé e a ideologia têm a função de corromper a informação e impedir que ela circule. A mentira é sempre consciente e não se deve confundir com a má-fé, que é a dissimulação da verdade de nós mesmos, o que nos dá uma grande segurança perante os outros. A má-fé e a ideologia são utilizadas quando a mentira não resulta, o que não é assim tão frequente como se julga, por serem soluções mais complexas, que requerem mais tempo, energia e até inteligência. A mentira não tem vida duradoura nas ciências exactas a não ser que se torne numa verdade oficial de um regime totalitário, como foi o caso da biologia de Lyssenco na União Soviética. Mas em democracia são frequentes as mentiras nas ciências sociais. São bem conhecidos os casos em que vários sociólogos quiserem demonstrar as desvantagens das sociedades liberais. Essas teorias, baseadas em grande parte em informação falseada, chegaram a ser consideradas verdades demonstradas.

Felizmente que nas democracias modernas não existe censura, mas ainda assim há um substituto que quer estar à sua altura: O Tabu. O tabu é uma interdição ritual que limita a liberdade de expressão, sendo instituído pelo ideólogo de quem todos têm medo da reacção. Para Jean-François Revel, o Grande Tabu das sociedades ocidentais é a crítica aos regimes de esquerda. Se por acaso essa crítica acontece, terá de ser imediatamente compensada com crítica tão ou mais contundente a uma sociedade capitalista democrática ou a uma ditadura de direita.

Uma forma de desviar as atenções sobre os regimes comunistas é manter vivo o receio de existir actualmente, a nível mundial, um perigo de um totalitarismo de direita como o que se verificou nas décadas de 30 e 40 do século XX. Apesar do nazismo e do fascismo terem sido derrotados há várias décadas, à custa de muito sangue, a esquerda insiste em manter a vigilância. Conseguem ver a essência nazi na ditadura de Pinochet, no apartheid ou mesmo numa simples deportação de estrangeiros ilegais (Esta passagem reflecte em especial as condições vividas na época em que o livro foi escrito. Actualmente a ênfase está posta sobretudo no antiamericanismo e na luta contra a globalização. Estes assuntos serão abordados em outros posts baseados em outro livro de JFR “A Obsessão Antiamericana”. Contudo, em Portugal a retórica antifascista encontra-se bem viva ainda, onde questionar as funções do Estado, o modelo de Segurança Social ou os direitos adquiridos só pode revelar uma mentalidade salazarista).

Com o Grande Tabu instituído, as críticas ao gulag de nada serviam porque nos lembravam logo dos campos de concentração nazi. Os defensores do regime soviético diziam que o ocidente não podia criticar o comunismo enquanto existisse o apartheid mas nunca ninguém ousou dizer o inverso. A luta contra as injustiças do mundo foi transformada numa batalha contra os novos nazismos. Há uma tentativa paradoxal de recusa em conhecer a História mas ao mesmo tempo tentar revivê-la em forma de encenação. O resultado imediato é que as causas das injustiças presentes são totalmente olvidadas, ou seja, a ignorância voluntária sobre o passado facilita a maior fraude possível no presente.

Daqui foi um passo para a banalização do insulto supremo, apenas possível no sentido de criticar as democracias liberais e os regimes de direita. Para a esquerda, tudo o que sejam ideias contrárias às suas é fascismo. Isto obrigou a direita a não só a aplicar políticas de esquerda como a adoptar grande parte do seu discurso.

MC

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