Tudo se alterou quando descobri que existia uma coisa chamada anti-americanismo e a ingenuidade teve o seu fim. No 11 de Setembro julguei que algumas manifestações de felicidade que via à minha volta teriam só duas explicações. Ou era apenas um disfarce para o nervosismo ou uma antipatia pueril pelos americanos, momentânea e que rapidamente se iria desvanecer. Mas a sequência de brutal demência que se seguiu, e ainda continua 5 anos depois, não se mostrou passageira ou mas um movimento sólido, com alicerces profundos e extremamente perigosos.
Tentando resumir a sequência de memória, foi mais ou menos assim. Primeiro foi a alegação de o 11 de Setembro só ter acontecido devido à acção que os EUA tiveram no mundo nas últimas décadas. Naturalmente que não se pode dizer que os americanos saíram imaculados de todos os locais que se meteram, mas se não fossem eles a União Soviética teria carta branca (e passadeira vermelha estendida pelos partidos de esquerda mundo fora) para dar azo ao seu imperialismo demente e a quase totalidade do globo viveria em regime colectivista, na absoluta miséria e sem a mínima liberdade. Depois, chamados à atenção de a maior parte das vítimas, nas torres gémeas serem civis e de mais de 80 nacionalidades, vieram com a argumentação relativista de que não há vítimas inocentes e todos têm a sua parte de responsabilidade. Para esta gente parece que só mesmo os terroristas não têm desculpas a apresentar.
Mas o melhor ainda estava para vir, com a invasão do Iraque. Não é minha intenção discutir a questão em si, porque abordada de forma séria tem bons argumentos de ambos os lados e a ideia agora é apenas fazer um roteiro da demência. O tempo que mediou desde o ataque ao Afeganistão e as hesitações da Administração Bush abriram completamente o flanco para as mistificações criadas. O dossier das armas de destruição maciça (ADM) foi completamente invertido na comunicação social. Se inicialmente era o Iraque que, segundo as resoluções da ONU, teria de provar que tinha destruído as suas ADM, num passe de mágica passaram a ser os americanos a ter que provar que elas existiam. Não se percebe muito bem porque Bush e companhia se colocaram assim tão a jeito para se exporem ao ridículo. Mas o certo é que toda a gente pensava mesmo que mal se entrasse no Iraque se iria tropeçar em armas químicas e ogivas nucleares, não só os serviços secretos americanos (que tão mal funcionam), bem como os serviços secretos de outros países insuspeitos como a França e a Rússia. Mas não só, os próprios anti-americanos também pensaram que se iriam encontrar ADM, porque se apressaram a dizer que se fossem descobertas só podiam ter sido os americanos a tê-las lá colocado.
Mas a sequência de argumentos brilhantes estava longe do fim. Houve o argumento do petróleo, os americanos foram lá para roubar petróleo. Não se deram ao trabalho de procurar os documentos que mostravam claramente para onde ia o petróleo e curiosamente agora o argumento já não faz eco. Então não é fácil provar que o dinheiro do petróleo está a engordar as contas dos amigos do Bush? Depois houve o argumento genial de que os americanos sabiam que havia ADM porque tinham sido eles a vendê-las. Referiam-se ao tempo em que os EUA apoiaram o Iraque na lógica de contrariar um perigo bem maior do Irão. Não se preocuparam em saber que os EUA foram dos primeiros a cortar essa ajuda, bem antes da primeira guerra do golfo, e que o armamento iraquiano era composto com material das mais diversas proveniências, mas em especial da Rússia, China e França.
Os anti-americanos também juraram a pés juntos que o Iraque não tinha nada a ver com grupos terroristas. Não há terroristas no Iraque, diziam eles. Pouco depois rebentou a vaga de ataques terroristas no Iraque. Longe de verem aqui a sua posição fragilizada, aproveitaram para lançar nova argumentação, de que a invasão provocava o terrorismo. Até parece um argumento sério, mas se pensarmos bem, será que numas poucas semanas indivíduos normais tornam-se em bárbaros terroristas? Em vez de geração espontânea não terá existido antes uma concentração do que já existia? Esta até pode ter sido uma das razões ocultas para a invasão, fazer a luta contra o terrorismo bem longe das fronteiras dos EUA. Muitas outras fantasias se criaram, como a do saque do museu de Baguedade, até aos delírios que querem fazer crer que o 11 de Setembro foi uma encenação dos próprios americanos.
Mas aos poucos comecei aperceber-me que a questão era ainda mais grave. Não era apenas ódio contra os americanos. Tudo o que fosse um ataque no mundo livre era exaltado ou no mínimo, ignorado. Muitos apressaram-se a ceder à chantagem a propósito das caricaturas de Maomé. E aos poucos tornou-se para mim evidente que o que está em questão é mesmo o ódio à liberdade, ao sucesso alheio e aos valores do ocidente que se gerou no interior do próprio ocidente. O movimento em causa já não tem grande coragem para sugerir uma alternativa socialista. Preferem aderir a causas minoritárias ou, ainda mais preocupante, a causa alguma. O que é impressionante é mesmo assim terem tanta energia.
MC
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