sexta-feira, março 09, 2007

Alienação voluntária

Ao homem comum, e todos os homens são comuns do ponto de vista apropriado, não se pode esperar um conhecimento aprofundado dos vários problemas que afectam o mundo. As suas fontes são a televisão, um pouco a rádio e os jornais, mas sobretudo as conversas do café. Não lhe passa pela cabeça que o conhecimento nunca se faz sem um grande esforço, onde é necessário avaliar argumentos contraditórios, que de início parecem ter validades semelhantes e para distinguir entre o trigo e o joio é necessário avaliar cada uma das ideias em pormenor e os fundamentos em que se baseia, os quais, por sua vez, carecem com frequência de um procedimento semelhante, sendo uma tarefa com um número de passos indeterminado à partida e, por isso, sem a garantia de obter uma resposta conclusiva.

O homem instruído teria obrigação de conhecer este procedimento e aplicá-lo nas discussões sérias, pelo menos nos limites da exequibilidade possível face ao contexto. O que podemos ver na blogoesfera, nos comentadores e nos próprios bloggers, a maior parte deles com formação universitária e muitos mesmo professores do ensino superior, é uma aversão visceral a este processo de busca da verdade. Como se não bastasse, quando maior é a aversão, maior é o empenho em se mostrar dono da verdade. Ao menos, se não se preocupam em chegar mais perto da verdade, estas pessoas instruídas sabem também que existe uma tarefa infinitamente mais fácil: Desmascarar a mentira e o erro.

Mostrar a existência de um erro é relativamente fácil porque não obriga a criar uma teoria alternativa, basta apontar incoerências, lacunas, testar cenários com as teses propostas e obter conclusões impossíveis, etc. Mas, para aqueles que não têm paciência, arte ou engenho para esta tarefa, poderiam ao menos reconhecer o mérito de quem o faça. Mas até isto é raro. O que é frequente é a tentativa de lançar descrédito e o insulto sobre quem faz esse trabalho. É neste contexto que se lançam apelos a consensos científicos e políticos, não por se contar com a ignorância do homem comum, mas sim a contar com militância alienada, anti-verdade, do homem erudito.
MC

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