sexta-feira, setembro 28, 2007

Guerra cultural (10)

AS TRINCHEIRAS (2)

Como foi dito no post anterior, é necessária uma profunda motivação para fazer guerra cultural, já tendo sido vista de onde ela vem para o lado revolucionário. Mas para o lado oposto é difícil encontrar os motivos, só estando a ver dois. O mais óbvio é o masoquismo. Num repente, quem envereda pela oposição ao movimento revolucionário estará a defender posições com as quais ninguém concorda e a maior parte nem irá entender minimamente. Não nos irão acusar apenas de termos ideias estranhas mas, como afrontamos o paradigma dominante, vamos ser olhados com apreensão e repulsa. Não irá demorar até nos imputarem más intenções e tentar manchar a nossa reputação. Alguns “amigos” irão afastar-se e a situação profissional poderá ficar complicada.

A outra motivação para enveredar pelo lado fraco da trincheira é o profundo amor pela verdade. Apenas alguns homens são naturalmente bafejados por essa maldição. Uma sociedade só poderá respeitar a verdade se tiver uma vivência intensamente religiosa, onde cada homem se sente vigiado mas também apoiado pela transcendência. Quem procura a verdade ficará condenado à solidão. Parece paradoxal que a mentalidade revolucionária consiga formar movimentos de grupo apesar de se basear em sonhos irrealistas, não existindo dois iguais, ao passo que a busca da verdade, apesar da sua universalidade e objectividade, leve à solidão.
A falsa unanimidade nos movimentos revolucionários é obtida através de formulações vazias que, precisamente por isso, podem conter qualquer coisa. A união é também reforçada pela existência de um inimigo comum e bem definido. Apesar de disso, cada grupo revolucionário tem um estilo próprio, uma linguagem distinta e até rituais únicos. O indivíduo passa a ter uma profunda identificação com os símbolos do seu movimento. As formas vazias de conteúdo passam as estar plenas de emotividade. A partir daqui encontra-se a explicação para antipatia entre movimentos revolucionários, quando seria de esperar que cooperassem porque, vistos de fora, têm projectos praticamente iguais. O indivíduo de mentalidade revolucionária procura um discurso e uma simbologia que façam ressonância com os seus anseios. Apegando-se a um formato, todos os outros irão parecer-lhe caricaturas grotescas, pelo que vai acusá-los de não serem verdadeiros e contrários aos interesses da revolução.
MC
|