sexta-feira, maio 04, 2007

Distorções morais

Chantal Delsol fala no seu livro “Icarus Fallen” que actualmente a moralidade baseia-se unicamente na emoção, estando totalmente separada do seu fundamente essencial, que é a verdade, em geral alguma verdade religiosa. A partir daqui acrescento que a relação é complexa uma vez que as próprias reacções emocionais derivam, em parte, das concepções morais. Mas, uma vez perdida essa ligação à «verdade», tudo passa a ser possível. Mais pernicioso que a total perda do sentido da moralidade é a sua deturpação completa. Os indivíduos amorais estão ainda constrangidos pelos instintos que não só têm em vista a auto-preservação egoísta mas também fornecem algumas ferramentas para harmonização social. Não constitui isto uma defesa do «bom selvagem» mas apenas notar que um «selvagem» no meio da civilização é bem menos nefasto que um indivíduo com a moral deturpada.

Isto acontece porque a moral deturpada consegue derrubar todas as barreiras, cometer todos os crimes e, ainda assim, ter um sentimento de superioridade sobre tudo e todos. O que se torna dramático em termos sociais é a influência que apenas alguns elementos «transtornados» conseguem induzir na “consciência global”. Não é por moral a cristã ter vindo a perder peso que deixa de haver necessidade do sentido da moralidade. É caricato que aqueles que criticavam a aceitação da moral cristã sem qualquer sentido crítico, venham agora propor morais alternativas, irritando-se de sobremaneira quando alguém tenta avaliar as suas propostas. Justificam a sua intolerância com as intolerâncias passadas, mesmo que estas tenham ocorrido há centenas de anos. A Inquisição servirá de desculpa eterna, inclusivamente para as inquisições que agora tentam fazer e em grande parte já fazem, aproveitando o vazio moral que eles mesmos ajudaram a criar.

Uma notícia do Portugal diário indicava que Paulo Portas recuperava uma máxima nazi (“O trabalho liberta”), que deixou escapar durante comemorações do 1º de Maio. Não que Paulo Portas possa queixar-se de mau tratamento pela comunicação social, pelo contrário, foi uma excepção. Alguns dias antes José Mário Branco usava os telejornais para explanar as suas visões do mundo. Criticava o capitalismo e disse que isto já não ia lá com palavras mas só partindo tudo e construindo depois uma nova sociedade. A forma como estes exemplos são recebidos mostra bem que as palavras de Chantal Delsol descrevem com precisão a sociedade portuguesa. Interessa apenas o efeito emocional do que se diz e não a verdade ou a mentira implícitas. A direita é nazi? Não interessa, mas apenas que dizer isto provoca uma forte emoção de regozijo. Por outro lado, quando elementos da esquerda totalitária (passando o pleonasmo) defendem acções que qualquer neo-nazi aplaudiria de pé, são admirados porque utilizam um discurso com uma simbologia que evoca admiração e respeito.

MC

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