Jean-François Revel (15)
PORQUÊ TANTO ÓDIO… E TANTOS ERROS
Jean-François Revel era da opinião que «os erros dos americanos têm consequências tanto mais nefastas quanto maior é a sua hegemonia.» Por isso é não só importante como imperativa a denúncia dos verdadeiros erros. A preocupação dominante é outra, com um discurso parcial que dá a sensação de procura de desforra, por isso «os americanófobos põem em pé de igualdade os terroristas e os que decidem resistir-lhes.» A guerra no Afeganistão foi criticada pelos pacifistas por ter sido uma réplica, quando eles pediam uma negociação política com os terroristas. Nos dias seguintes ao 11 de Setembro surgiram as primeiras ideias de que os EUA tinham culpa nos atentados por serem geradores de pobreza e por apoiarem Israel.
A ideia dominante afirma que o terrorismo contra os americanos deve-se ao avolumar de pobres no mundo. Trata-se de um erro triplo. Em termos percentuais, o número de pobres tem diminuído nas últimas décadas e não aumentado. Os locais onde a pobreza se tem mantido ou aumentado são precisamente aqueles que menos têm interagido com os EUA. Por último, o terrorismo nunca foi uma arma dos pobres, tendo sempre surgido em locais de relativa abastança e associado a causas nacionalistas, ideológicas ou religiosas.
O que distingue um terrorista de um resistente? Uma situação em que se pode considerar o uso a violência mais legitimado é no combate a uma ditadura totalitária, em especial se suportada por um exército estrangeiro. Contudo, grupos terroristas como a ETA, o IRA, as Brigadas Vermelhas ou o Sendero Luminoso operam em regimes democráticos onde se podem expressar e ir a votos. «Os militantes destes movimentos foram sempre minoritários nas urnas e se mataram, ou ainda matam, é por falta de capacidade de convencer. Têm por inimigo a democracia, não a tirania. Com o resistente passa-se exactamente o inverso. Eis um critério simples e claro para definir o terrorismo. Em vez de libertar, submete. A outra característica do terrorismo reside no facto de tomar como alvo principalmente cidadãos comuns e indefesos.» Há ainda a ilusão de ser possível negociar com o terrorismo se compreendermos as suas motivações. Acontece que os objectivos do terrorismo são «vagos e infinitamente extensíveis, sem que se possa encontrar um elo de ligação racional entre esses objectivos e os meios usados para a sua prossecução.»
Especialmente depois do 11 de Setembro tem sido cultivado o mito do Islão tolerante e moderado. Dizer que o Corão não justifica a violência em caso algum é ignorar as múltiplas passagens que instigam ao contrário. Ao invés de ser tolerante, o Islão pede sim é tolerância para si mesmo enquanto acha que não deve respeitar mais nenhuma religião. Há também o mito de que o grosso dos muçulmanos condena o terrorismo, mas são inúmeras as manifestações que o apoiam e a condená-lo são quase inexistentes. «Se existem [os moderados], não se fazem ouvir. Os dirigentes políticos muçulmanos que no Paquistão e na Arábia Saudita condenaram os atentados por razões políticas e estratégicas, pagaram essa temeridade com a perda de popularidade nos respectivos países.»
«O que os integristas censuram na nossa civilização não é o que ela faz, é o que ela é, não são os aspectos em que ela falha, são os aspectos em que triunfa. Assim, todas as cantilenas sobre a necessidade de se encontrar uma «solução política» para o terrorismo islâmico assentam sobre a ilusão de que tal remédio possa existir num universo mental irremediavelmente afastado da realidade.» Os textos que circulam na comunidade islâmica a exortarem o terrorismo deviam elucidar-nos sobre alguns pontos. Não são apelos feitos por ignorantes com o objectivo último de obter ajudas para combater a pobreza. Pelo contrário, são escritos por indivíduos com formação universitária que defendem o uso de meios violentos para o derrube de regimes “sem Deus”e concomitante expansão mundial do Islão. A extrema-direita e a extrema-esquerda regozijaram com o 11 de Setembro e mesmo os círculos moderados na esquerda aconselharam os americanos a tirar uma lição destes atentados. As culpas acabam por ser atiradas também à globalização e ao neoliberalismo e assim, de forma indirecta, mais uma vez aos americanos. Com este atribuir de culpas, os EUA tornaram-se no único país (juntamente com Israel) que perdeu o direito à própria defesa.
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