sexta-feira, maio 05, 2006

Comentar sem conhecer o assunto

Vou comentar dois assuntos sobre os quais não tive tempo, nem grande vontade, de me inteirar devidamente. Em geral é o que fazem os comentadores nacionais. Mas ao invés disso os colocar numa posição de grande humildade, pelo contrário, o desconhecimento profundo permite que se avancem com todo o tipo de teorias fantásticas, porque a ignorância dos factos deixa incólume todo o tipo de ideias disparatadas. Por isso, é um exercício arriscado a que me proponho, tentando não extravasar nas conclusões quando não tenho dados suficientes para tal.


SUBSÍDIOS À MATERNIDADE

Julgo que a ideia é subsidiar (ou dar mais tempo de licença de parto, mas para o caso não importa) as mulheres que tenham 2 ou mais filhos, como mais uma medida que ajuda a garantir a Segurança Social até 2050. A verdade é que é tão realista afirmar que com estas medidas avulso, que vão sendo anunciadas, asseguram a sustentabilidade da Segurança Social por mais 50 anos como até o dia do Juízo Final. Basta pensar na evolução que as sociedades tiveram nas últimas décadas para saber que a única coisa previsível é a imprevisibilidade. Nem vale a pena dizer que em 2050 nenhum dos implicados estará cá para lhes pedirmos contas, não, daqui a 6 meses já ninguém se lembra, por isso acho que deviam ter avançado mesmo para o dia do Juízo Final. Não me vou alongar sobre a questão das medidas em cima da mesa poderem ter efeitos contrários aos desejados, já que isso é uma constante no estatismo, nem sequer falar na discriminação, onde, para ser demagógico, mulheres estéreis vão subsidiar parideiras de bairros de lata.

Continuando em tom agressivo e demagógico, já vi casos em que famílias pobres decidiram ter mais um filho para receber mais um abono de família. Agora, a ideia penso ser promover o aumento da taxa de natalidade nas famílias de classe média, porque são essas que podem dar alguma esperança ao futuro de todos. Os ricos obviamente não precisam de benesses. Os pobres, como comecei a querer dizer de forma ultrajante, vão ver um sinal para colocar mais um desgraçado no mundo, que irá sempre fugir aos impostos mas dele recebendo avenças por maleitas reais ou imaginárias.

Mas falando um pouco mais a sério, será que as verdadeiras causas da baixa taxa de natalidade se resolvem com decisões centralizadas? Não que o Estado não possa fazer algo, mas podia simplificar baixando os impostos para todos. Não era discriminatório e poderia ser mais eficaz. Mas o problema é que a classe média encara hoje a decisão de ter um filho de forma muito mais pensada que anteriormente e tem razões para isso. Os filhos anteriormente quase que se criavam por si, na rua que era segura, nas amas que cobravam valores simbólicos e muito cedo começavam a trabalhar. Hoje, a criança ainda não nasceu e já está inscrita num infantário para ter vaga quando for necessário. Os pais fazem uma ginástica diária para conseguir depositar e levantar os filhos nos lares infantis, que são caríssimos. Pela frente têm à volta de 20 anos de estudo onde irão gastar cada vez mais. Não esquecendo da elevada probabilidade de que o filhos em bebés chorarem toda a noite e em adolescentes odiarem os pais e criticá-los nas ínfimas coisas. E entre estes dois estados há uma fase de desenvolvimento em que os filhos dominam totalmente os pais, que são uns fracos e fazem toda e qualquer vontade àquelas pestes. E todos querem colocar uma nova criatura no mundo num ambiente seguro e próspero e não num onde pairam ameaças de terrorismo, crises energéticas, colapso dos sistemas sociais, etc. Se o governo pensa que algumas benesses fazem esquecer estes contras, engana-se, obviamente.


SUBSÌDIOS À AGRICULTURA

Não sei bem do que reclamam os agricultores. Talvez, para variar, até tenham razão. Razão, razão não terão, porque quem vive de mão estendida e não é necessitado não merece grande respeito. Mas admitamos que têm mais razão que o ministro. A única coisa que me chama a atenção nos agricultores e respectivas associações é serem a prova que os subsídios são uma armadilha tripla. São uma armadilha para nós contribuintes, que acreditamos nas loas nacionalistas de que comer nacional é que é bom e acabamos por comer pior e mais caro, ao mesmo tempo que impedimos que países pobres se possam desenvolver. São uma armadilha para os agricultores, que se habituam ao laxismo, à irresponsabilidade, não estando minimamente preparados para as dificuldades nem para o fim da mama que algum dia terá que acabar. E finalmente, são armadilha para os próprios governantes, que cedendo em dar sempre mais um subsídio, não percebem que ao invés de contentarem os subsidiados criam apenas criaturas vorazes e ingratas. São precisamente os mais favorecidos pelo Estado, os mais tenazes a pedir demissões à primeira contrariedade.
MC
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