segunda-feira, março 14, 2005

O novo moralista (5)


O novo moralista é também um pragmático, sabe adaptar-se aos tempos. Como disse anteriormente, tornou termos como capitalista e neo-liberal adjectivos negativos, mas fica-se por aí por saber que não tem argumentos que possa esgrimir de forma coerente. O seu pragmatismo leva-o a rejeitar discussões sobre estas teorias e práticas, mas também o leva a rejeitar rótulos que se tornaram desagradáveis, como “comunista”. Tenho também que admitir que o novo moralista não tem o poder quase absoluto que tinha o antigo moralista. Por isso, o novo moralista, não pode furtar-se sempre ao debate.

As estratégias de debate do novo moralista são várias. Entre elas, encontra-se o anunciaram-se como Os Defensores dos valores sociais, o insultar dos seus adversários, para que estes fiquem diminuídos e negativamente rotulados face a um público, que em geral é mal informado (o novo moralista faz por isso). O novo moralista é um oportunista. Tem aversão ao mercado, mas sabe que a renúncia completa ao mercado não atrairia muitas pessoas. Afinal, estamos presos à economia de mercado, e quase tudo o que podemos fazer deve-se a esta teia complexa de interacções. Por isso, o novo moralista fala dos excessos do mercado, do mercado pouco regulado, que devia ser mais controlado.

Podia fazer-se aqui uma nova analogia com o antigo moralista. Este, reclamava ter a solução para os problemas que antes tinha feito crer existirem. Da mesma forma, o novo moralista anuncia ter a solução para os problemas que vem anunciando (uns reais, outros ilusórios). Contudo, as soluções do novo moralista mostraram já muitas vezes que podem ser completamente ruinosas. Daí, o novo moralista opta muita vezes por não apresentar quaisquer propostas relevantes, acenando apenas com algumas bandeiras morais (é fácil ver aqui relações com o programa eleitoral do BE).

O oportunismo do novo moralista é evidente. É o defensor de todas as novas causas, desde que estas mostrem que têm vindo a ganhar aceitação popular, como o aborto ou a ecologia. O que a realidade mostra é que o aproveitamento pelo novo moralista destas e de outras causas é prejudicial para as próprias causas em si. O novo moralista não tem real interesse de resolver os problemas, mas apenas usar os problemas como forma de fazer propaganda de si próprio.

A ruína do antigo moralista deveu-se em parte pela rigidez da sua actuação. O novo moralista, felizmente, não se prevê conseguir ter o poder quase absoluto do antigo moralista. Contudo, a flexibilidade da sua actuação é impressionante (veja-se como num ápice eram contra a globalização e logo de seguida já queriam fazer a alter-globalização), o que pode significar que estarão cá por muito tempo e a sua influência será grande. É bem possível que daqui a alguns anos defendam causas bem diferentes, quem sabe até opostas às actuais em alguns pontos.

Não sei se este novo moralista é melhor ou pior do que o antigo. Penso que são os novos propagadores do obscurantismo e aqueles que mais fazem para limitar a liberdade de todos nós. Apreciando eu a liberdade, não faço mais do que descrever aquilo que me parece ser a realidade (mas sei que as melhores descrições da realidade são pálidas imagens). Mesmo se tivesse uma varinha mágica, não iria impedir o novo moralista de se exprimir e de difundir as suas ideias, que me parecem profundamente erradas, e terem atingido quase um estatuto de dogmas. Contudo, não deixo de escrever estas coisas, mesmo sabendo que só serão lidas por meia dúzia de pessoas e sua influência será quase nula. As ideias verdadeiras têm infinitas possibilidades de serem descobertas ao longo dos tempos. As erradas, têm menos hipóteses e só conseguem subsistir se tiverem quem lhes dê vida.

MC

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