O novo moralista (1)
Não vou dizer nada de novo, para começar. Já muitos afirmaram que o aumento da despesa pública é como uma droga. Quanto maior a dose, maior a necessidade. Não me surpreende que este tipo de argumentos, apesar de óbvios, colha pouco junto da opinião pública. Porque cada indivíduo tem a tendência de pensar só em si e não quer abdicar de nada, até porque sabe que o seu esforço isolado (e é impossível fazer-lhe crer que todos irão fazer um esforço idêntico) de nada serve.
Contudo, nem todos têm esta tendência ambígua de concordar na teoria mas nem querem ouvir falar da prática. Alguns, e são bem fáceis de encontrar em blogs e fóruns, advogam mesmo que devemos aprofundar o vício da despesa pública. Todas as soluções que visem resolver o problema são logo rechaçadas com argumentos que diria serem, sobretudo, morais.
Estes novos moralistas aproveitaram o testemunho perdido pelos velhos inimigos. Esse inimigo era uma direita retrógrada, conservadora até ao absurdo, aliada a uma igreja hipócrita que se arrogava de altos pergaminhos morais, lançando anátemas por tudo e por nada, controlando assim, pelo medo, ignorância, censura e mesmo coerção física, a vida de milhões de pessoas. O salazarismo, esse socialismo cristão que nos fez navegar por águas mortas durante décadas, caracterizou-se pela coerção moral.
Foi esse testemunho que recuperaram os socialistas de todos os partidos portugueses, em especial os que adoptaram soluções keynesianas, trotskistas e marxistas. A ilusão da sua moral ser diferente da moral salazarista é a ilusão de que a essência das coisas se muda por uma reformulação da linguagem e não do conteúdo. A linguagem mudou, os papões são outros. Agora não se quer proteger a moral e os bons costumes. As novas heresias não são decalcadas dos pecados mortais cristãos.
(cont.)
MC
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