sexta-feira, setembro 17, 2004

Escândalos nacionais – Primeiro escândalo

Fui ontem surpreendido por dois “escândalos nacionais”, de uma surpresa fantoche, como se de uma surpresa infinda se tratasse. Essas calamidades foram, na boca dos jornalistas (que depois colonizam a alma do povo), a abertura falhada do novo ano electivo e a reforma de luxo de Mira do Amaral com a saída de CGD. Este post será dedicado ao primeiro assunto.

A abertura do ano lectivo foi a confirmação de um falhanço anunciado. O próprio governo uns dias antes admitia que os professores não estariam todos colocados. Claro que os jornalistas iriam sempre ver a metade do copo que estava vazia, escolher casos particulares de escolas com professores quase todos por colocar e nunca uma em que o funcionamento estivesse em pleno. Claro que a oposição, pais e sindicatos iriam criticar. Claro que o primeiro ministro iria dizer as frases da praxe, admitir que tinham existido problemas, mas iriam apurar-se responsabilidades, tudo se iria fazer para no ano seguinte não se voltar a repetir o mesmo. Claro que nada de essencial se iria discutir...

Há aqui um falsa questão de fundo, que é o problema informático que deu origem a um transtorno enorme a pais, professores e alunos, ainda muitos com futuro incerto (suponho que ainda seja esta a desculpa oficial). Um ministério da educação de Salazar talvez tivesse um número reduzido de escolas para que fosse maleável geri-las todas centralmente. Além do mais, o pendor totalitário do regime nunca permitiria liberdades maiores a cada escola numa matéria tão sensível. Muda-se de regime mas não se perde a vontade de controlar de cima, tudo com boas intenções. Cada ministro da educação pensará ter a receita mágica para tudo.

A gestão do ministério da educação é semelhante à de muitas pequenas empresas. Nestas, é comum existir apenas um “patrão” que é responsável por tudo. Só ele tem os contactos, não passa informação relevante a ninguém, não comecem alguns também “a querer dar opinião”. Se o patrão tira férias, a empresa também. Se ausenta-se, labora-se a meio gás. Se parte uma perna a empresa fica coxa. Por razões profissionais, contactei com muitas empresas assim. É comum os funcionários não conseguirem dar uma resposta básica de sim ou não, tão amarradas que estão, parecendo amedrontados com algo. Este tipo de chefia conduz a um aprisionamento do espírito, que impede qualquer crescimento saudável da empresa.


Um ministério que assim funcione faz com que um pequeno problema central se repercuta em milhares de escolas. Não se espere que se mude as coisas de um dia para o outro. Nenhum partido quer abdicar do controlo central e nem as escolas e autarquias querem ter mais responsabilidades. As pessoas acham que não estão preparadas para a liberdade. O ministério não abdica das coisas mais básicas, acha que as escolas são incompetentes para contratar professores, incompetentes para definir critérios pedagógicos, incompetentes para fazer os seus próprios currículos. Como podem os pais confiar nas escolas se é o próprio ministério que nelas não confia?

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