sexta-feira, junho 15, 2007

O triunfo dos filhos da puta


No centro de Lisboa está em cena a peça “Querido Che”. Li também numa manchete de jornal que o PS recuou na lei totalitarista sobre o tabaco. Que relação podemos ver entre estes dois acontecimentos? Do ponto de vista deste vosso modesto escriba, não devemos ficar demasiado satisfeitos com o segundo à luz do primeiro. Quando a cultura popular, e o teatro é apenas uma emanação ligeiramente mais erudita desta, não se envergonha de elogiar símbolos de uma revolução que conseguiu suprimir quase todas as liberdades, devemos ter consciência que vivemos num contexto fortemente polarizado, dito de outra forma, num contexto onde a “filha da putice” é rainha e senhora. Aquando do primeiro referendo sobre o aborto, a alegria dos que conseguiram manter a situação como estava prometia logo ser de curta duração. Os partidários do abortismo livre não tiveram problemas em assumir que iriam insistir na questão até terem sucesso. E alguém só pode ter esta arrogância depois de ser derrotado quando sente que o vento está a mudar a seu favor.

Entre os muitos defeitos dos partidários das causas progressistas, o cinismo é um dos mais esquecidos. À medida que as suas causas vão ganhando protecção legal, afirmam que estão a lutar contra os poderosos. Insistem nas conspirações escondidas que nos dominam, ao mesmo tempo que ganham poder com as suas conspirações explícitas. Quando o New York Times, um dos jornais mais influentes do mundo, diz que uma entrevista com Noam Chomsky são duas horas de lucidez e este senhor, nitidamente esquizofrénico, não teve qualquer pudor em defender o genocida Pol Pot, podemos afirmar com bastante rigor que os filhos da puta têm bastante poder neste mundo.

O exemplo não é isolado. Meios de comunicação social de todo o mundo apaparicaram a revolução “chavista” em curso na Venezuela, bem como a subida ao poder do “operário” Lula. Quando Chávez ordena o encerramento de um importante canal de televisão e Lula aplaudiu, os media começaram a sentir-se confusos. É certo que a televisão em causa faz parte da oposição ao regime, mas mesmos os jornalistas mais vendidos às causas progressistas não deixaram de sentir que a sua classe foi atacada. Das suas uma, há aqui uma grande ignorância ou uma cegueira ideológica que não quis ver o óbvio. Para uma ditadura manter o poder, o essencial não são os militares mas o controlo da informação. Por isso era evidente que Chávez, com um declarado projecto socialista que diariamente vai desmantelando a democracia, iria mais tarde ou mais cedo optar por este caminho. E depois de afastados os jornalistas mais críticos, serão perseguidos os que não prestarem vassalagem total. Só quem não tem o mínimo conhecimento da história do século XX pode duvidar que assim seja.

Por cá temos uns patetas que, envergonhando-se de mostrar a sua admiração por Chávez, justificam tudo com a sua legitimação democrática. Da mesma forma, irritam-se com aqueles que criticam a OTA, a lei do tabaco ou a subsídio ao aborto porque são tudo coisas que resultaram da legitimação do voto. Chamamos imaturas as democracias onde os derrotados não aceitam os resultados das eleições e tentam dar a volta com um golpe de Estado. Em 30 anos Portugal conseguiu passar de uma democracia imatura, pensemos no PREC, para outra esclerosada. Não só aceitamos pacificamente os resultados eleitorais como a usurpação crescente de poderes por parte do Estado. Os filhos da puta triunfam porque já somos todos filhos da puta e, como escreveu Alberto Pimenta, o sonho do pequeno filho da puta é ser um grande filho da puta.

MC
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