quarta-feira, outubro 12, 2005

Direito à indignação

Pacheco Pereira indignou-se com Fátima Felgueiras e Valentim Loureiro ao ver os seus discursos de vitória. Achei piada a Fátima Felgueiras, enquanto Valentim Loureiro causou-me asco, mas isto é um problema meu, que tenho aversão visceral a tal pessoa . Mau feitio meu, concerteza, porque o que ele transmite em público é um modelo de elegância e delicadeza.

Se tivesse a mesma visibilidade de Pacheco Pereira apelaria à indignação em outra direcção. Os sindicatos da função pública ameaçam mais greves, agora com mais visibilidade os do sector da justiça. É verdade que estes não podem alegar que vão causar grandes transtornos, como podem fazer os maquinistas da CP, por exemplo. Podiam parar durate um mês que a diferença não seria muita, dada a lentidão da “justiça”. A minha indignação não põe em causa que as pessoas são livres de defrender os seus direitos. Pelo contrário, o que me indigna é saber que estas pessoas são responsáveis pela sonegação dos meus direitos.

Não há nenhum sindicato que defenda os direitos dos contribuintes. O argumento fácil de que aquilo que nós damos ao Estado em impostos é-nos retribuído em serviços, segurança, saúde, educação, entre outros, é demasiado simplista para ser levado a sério. Sem entrar em profundidade na análise das funções que deviam caber ao Estado, ressalto apenas alguns argumentos que justificam a minha indignação. Em primeiro lugar, os impostos que pago ao Estado são-me retirados de forma coerciva. Em segundo lugar, aquilo que o Estado me devolve em “serviços” está claramente abaixo do que seria possível, mesmo que continuasse tudo na alçada do Estado.

Acontece que a pouca eficácia na prestação destes “serviços” pelo Estado é, na prática, uma limitação dos direitos dos contribuintes. Todos os meses fico indignado ao ver o meu recibo de ordenado, com a escandalosa parcela retida em impostos. Mas a colecta continua com o IVA, impostos sobre combustíveis e até o IRC, que se faz reflectir também nos clientes e não apenas nas empresas. Aquilo que me é retirado em impostos é uma limitação efectiva dos meus direitos e da minha liberdade. Há hipóteses que tenho de eliminar, planos que não posso concretizar. Não é ficção.

Quando os funcionários públicos se revoltam por lhes ameaçarem cortar as regalias que outros não têm e são pagas exactamente por estes, penso haver todo o direito à indignação. Ao juntar o isso o péssimo trabalho que realizam e a total irresponsabilidade de que gozam, o meu respeito por estes “mártires” cai a pique. Mas a minha indignação também irá desaparecer, porque isto de pregar no deserto só serve para ouvir o próprio eco.

MC
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